Rede Fórum discute o novo jornalismo digital e os desafios e rumos da esquerda no Brasil

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Renato Rovai e a equipe de profissionais da Fórum, ao lado dos convidados

No sábado (3), a Revista Fórum promoveu em São Paulo, o lançamento da ‘Rede Fórum de Jornalismo’, um novo espaço de colaboração e trocas de conhecimento, cujos participantes serão convidados a participar do Curso que seguirá pelo primeiro semestre de 2017, como primeira ação da rede,  com aulas à distância, atividades práticas e encontros presenciais, cujo encontro contou com 40 participantes, a maioria deles, jornalistas.

Segundo o editor e fundador da Fórum, Renato Rovai, a rede será uma espécie de um “think tank” ( organizações ou instituições que atuam no campo dos grupos de interesse, produzindo e difundindo conhecimento (ideologia) sobre assuntos estratégicos, com vistas a influenciar transformações sociais, políticas, econômicas ou científicas sobretudo em assuntos sobre os quais pessoas comuns (leigos) não encontram facilmente base para análises de forma objetiva, além disso será também um espaço de produção, construída com seus participantes, cujas matérias poderão ser divulgadas através da Fórum.

O jornal Contratempo esteve presente ao evento, representado pelo jornalista Luís Galletta, que conversou com Renato Rovai sobre os objetivos e perspectivas da Rede Fórum de Jornalismo. “O nosso objetivo é construir um espaço de resistência do ponto de vista da construção do  conhecimento e da difusão da informação. A nossa análise é que já existem vários espaços digitais fazendo mídia alternativa, que chamamos de mídia-livrismo, e o que queremos fazer é chamar essas pessoas que estão produzindo e construindo esses novos produtos, para refletir sobre o que estão fazendo e tentar fazer com que isto chegue a mais pessoas”, explicou.

Para Rovai, a existência da mídia-livrismo poderá criar uma nova geração de jovens com senso mais crítico e menos influenciada pelos meios de comunicação da grande mídia. ”As pessoas que fazem comunicação, constroem um raciocínio mais lógico do ponto de vista crítico, elas não aceitam o senso comum, elas querem dialogar e discutir. A gente tem hoje um momento tecnológico que permite a produção informativa e não simplesmente a absorção de informação, as pessoas querem contar a sua história, fazer suas entrevistas e reportagens e a gente vai tentar através deste Curso, estimular para que isso se amplie ainda mais”, ressaltou.

De acordo com o editor da revista Fórum, o grande objetivo da Rede é  propor o desafio de pensar o que é o jornalismo hoje, numa perspectiva digital e mídia-livrista. “Queremos discutir como eu trato minha fonte, se devo preservar ou não, se posso fazer uma gravação sem o conhecimento ou consentimento da minha fonte, como produzir a matéria, se devo sempre ouvir o outro lado ou não, ou seja, discutir os princípios que nos transformam num movimento, porque senão não vale a pena fazer, já que se agirmos sem critério, isso acaba afetando a nossa reputação e desconstruindo um pouco, esse lastro do tipo de produção que a gente faz”, concluiu.

Professor da Universidade Federal do ABC, Sergio Amadeu da Silveira

O evento

O evento teve início na parte da manhã, com a palestra do professor da Universidade Federal do ABC, Sergio Amadeu da Silveira, que ressaltou em sua explanação que hoje vivemos uma mudança na comunicação. “O meio técnico mudou. O rádio, por exemplo, não desapareceu, ele foi para a internet”, observou.

Como explicou Silveira, apesar de a internet ser uma rede de controle, melhora a capacidade de indivíduos poderem falar, criar seus blogs, suas redes. No entanto, o professor alertou que “o difícil não é fazer um blog, é as pessoas lerem o que você escreve”.

Outra questão trazida por Silveira são os novos intermediários da internet, como o Google, Microsoft e Facebook, que possui o WhatsApp. “O mundo dos blogs foi engolidos pelas redes sociais”, disse, lembrando do caso do Teatro Oficina que teve sua página na rede social excluída, no que o professor chamou de “censura privada”. “As vozes do poder estão na rede e em maior força”, comentou, destacando a importância da formação de redes que possam exercer o contrapoder.

 

Ivana Bentes e Dennis de Oliveira falaram sobre o jornalismo e ativismo

Jornalismo e Ativismo

A segunda mesa de debate do evento de lançamento da Rede Fórum de Jornalismo, sob o tema “jornalismo e ativismo”, foi marcada pela discussão dos desafios que a mídia alternativa carrega ao assumir o papel de exercer o contraponto informativo à imprensa tradicional. Os convidados, a pesquisadora da área de comunicação Ivana Bentes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e o professor de jornalismo da Universidade de São Paulo (USP), Dennis de Oliveira, tomaram em suas falas caminhos distintos, mas que direcionam a um caminho em comum: a necessidade da inovação e de uma inserção mais intensiva das mídias livres.

Para Dennis, o grande papel da mídia alternativa em um contexto da tão falada crise das instituições e pós-golpe é o de fortalecer esses projetos que contrapõe o senso comum e que, em sua maioria, acabam surgindo nas bordas das grandes cidades pela própria opressão a que essas regiões estão submetidas. “O papel do novo jornalismo, o alternativo, é ajudar a viabilizar essas iniciativas. Sair do cerco de fontes oficiais. Há uma potência presente nas periferias e nesse midialivrismo jovem”, analisou.

Para Ivana, nos últimos anos o jornalismo fez uma travessia da questão analítica para a questão “memética”. De acordo com a pesquisadora, a linguagem ilustrativa e objetiva dos memes, surgida a partir do fluxo intenso de informações da internet, exerce um poder ainda mais efetivo de persuasão que a reportagem de profundidade ou o texto explicativo, mas salientou que o campo da direita conservadora e suas mídias são aqueles que dominam essas novas ferramentas.

“As pessoas buscam uma argumentação pronta para aquilo que elas acreditam. A gente tem que levar essa memética a sério. A mídia conservadora tem usado essa questão dos memes de forma organizada, objetiva e de forma veloz”, analisou.

Como exemplo, Ivana citou as correntes de Whatsapp ou de outras redes sociais e plataformas comunicativas em que são espalhadas inúmeras inverdades que dificilmente são descontruídas pela mídia alternativa com seus textos analíticos. “Estou cada vez mais convencida de que precisamos criar uma escola de memes. Algo que possa complementar o jornalismo analítico”, pontuou, sem deixar de tecer uma crítica às mídias livres.

“Como a mídia livre vai entrar nos sites secretos e grupos como os de Whatsapp? Lá está se formando uma narrativa assustadora (…) A esquerda é conservadora em termos de linguagem e estética”.

O professor Dennis de Oliveira concordou com Ivana no que desrespeito à necessidade de uma inovação da linguagem das mídias livres mas atentou para o fato de que há, sim, atualmente, uma nova mídia que vem das periferias e que já adotam linguagens originais, próprias e inovadoras.

“Hoje a periferia faz sua informação (…) Ela [a periferia] não aceita perder os seus direitos e está, sim, organizada”, afirmou.

 

Gilberto Maringoni, Rosane Borges, Maria Frô e Reginaldo Nasser, discutiram os desafios e perspectivas das esquerdas

Desafios e perspectivas das esquerdas

A terceira mesa de debate  abordou o tema “O cenário atual: desafios e perspectivas das esquerdas” , a fim de discutir qual o papel da militância de esquerda no Brasil em tempos de golpe e contou com a presença de Rosane Borges (professora da USP e integrante da Cojira-SP), Gilberto Maringoni (professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC) e Reginaldo Nasser (professor do depto. de Relações Internacionais da PUC-SP).

Rosane Borges disse que depois do golpe que culminou com a saída da presidenta eleita Dilma Rousseff a esquerda brasileira está “na lona” e precisa entender qual é o seu papel. “Se nós estamos na lona a gente tem que saber se levantar dela e nesse processo de levante não ser golpeado novamente”, afirma.

Para ela, o grande desafio da esquerda brasileira é fazer com que os movimentos de minorias como o movimento negro, LGBT, feminista e sejam “seres comuns” e ocupem os espaços de tomadas de decisão. Ela criticou os anos de lulismo em que ascensão foi apenas econômica e não se preocupou com a representatividade nos espaços de tomada de decisão. “Se a gente não chamar as mulheres, os LGBT como seres comuns eles se a esquerda se manterá do ponto de vista da cultura, da subjetividade se pautando pelo sujeito ocidental branco”, disse.

Em seu argumento, Reginaldo Nasser disse que a esquerda brasileira precisa se “internacionalizar” e dialogar com movimentos progressistas de outros países. Ele disse que enquanto a setores da esquerda não dialogaram com outros movimentos semelhantes, a direita se internacionalizou e cresceu.“Se não tiver uma articulação internacional de luta, ela acaba se tornando muito pontual, se desfaz e não dá certo”, afirmou.

Ele acredita que uma dessas estratégias é o boicote a grandes corporações que financiam os políticos de direita, a grande imprensa e citou exemplos de boicote que deram certo ao redor do mundo, como o BDS palestino. “Boicote é uma arma de luta muito antiga, num primeiro momento a atitude é individual e na medida que eu coloco na rede e alguém adere vira um movimento capaz de incomodar”, disse.

Já o professor Gilberto Maringoni, disse que a esquerda sempre se renovou. Desde a revolução francesa, passando por Lênin, Mao-Tsé Tung e Fidel Castro. Ele ainda afirmou que o problema não é a conciliação de classes.

“O problema da esquerda não é a conciliação de classes, o Lênin fez conciliação, o Fidel fez conciliação. O problema foi que o PT entrou com o pescoço, mas a burguesia entrou com o pé. Ditando as regras da economia”, completou.

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