Tempo e contratempo
O tempo, cantado em prosa e verso, é a passagem cronológica dos seres humanos que apresenta seus contratempos. São surpresas, percalços e dificuldades na vida de todos nós. A editora deste site pediu -me um artigo autoral, opinativo e levei isso a sério. Mas, falar o que, todos parecem saber e tem opinião definitiva sobre tudo, como estabelecer o diálogo sem que se torne monólogo?
Política ninguém pode ouvir; a imprensa anda insuportável; a pandemia enclausura e leva as pessoas ao delírio existencial, neste momento de escassez hídrica e emocional, isolacionista e de comércio fechado. Tempo e contratempo. Bem sacado o título deste site. Um é o reverso do outro, a antítese, o contraponto. Só tem adversidade. A ordem é falar mal nesta etapa em que valorizamos o amor ao ódio. É proibido falar bem de qualquer coisa. Que coisa!
“…Compositor de destinos, tens a cara do meu filho, tempo, tempo, tempo, tempo…” – Caetano, o gênio da raça, cantou. “…Tempo-rei, ó tempo-rei, ó tempo-rei, exaltai as novas formas do viver…” – Gilberto Gil cantou com cacófago e tudo. Ó, te empurrei. Os grandes também escorregam em suas criações. É ninguém chia porque as estrelas brilham na escuridão. “…O tempo não apita na curva, não espera ninguém” (Reginaldo Bessa).
O tempo é, é tempo presente, o tempo sucede agora e flutua no ar, ausente, precedendo o futuro, o deus-dará. O vira-se, o ignaro, desconhecido, que todos temem e pressentem. O tempo inclui o futuro, o que se pressente e intui, porém ainda não aconteceu. O que será o tal “novo normal”? Nem os deuses atrevem-se a sabê-lo. É, se sabem, não anunciam. Para não atrapalhar o futuro presente. Se soubermos, somos capazes de desistir dele já, tal o pessimismo reinante. Neste presente ilusório, mentiroso, os enganadores usam bola de cristal e quiromancia, tem ilusão para todos os gostos. Mentem descaradamente. Tantos acreditam em qualquer coisa. Vivemos o contratempo. O tempo mascarado e isolado, de autoconhecimento e filosofia. O espelho da alma, do nosso verdadeiro eu, vem pirando muita gente. As pessoas não mudam. São mudadas. Salve-se quem puder. Nade ou afunde! Faça você mesmo. O tempo líquido encharca toda solidez.
Acho mesmo – arrisco minha opinião- que as pessoas precisam entender-se melhor, compreender a si mesmas, os impulsos de seu alter-ego compulsivo, com ou sem ajuda da psicanálise. Só na varinha de condão da intuição. A vida não vale a pena? Só se a alma for pequena, como poetou Fernando pessoa, o maior entre os maiores poetas lusitanos, mais vivo hoje que sobrevivente do covid 19. A vida é breve. Precisamos viver bem. Termino com os versos da marcha-rancho (Paulo soledade) que é um hino á vida: “vê, estão voltando as flores/vê, nesta manhã tão linda/vê, como é bonita a vida/vê, há esperança ainda/vê, as nuvens vão passando/vê, um novo céu se abrindo/vê, o sol iluminando/por onde nós vamos indo/por onde nós vamos indo”.
João Teixeira