Anos de Chumbo – A farsa do fim de Marighella – Parte 2
João Teixeira*
O triste episódio da execução sumária de Marighella foi uma zorra total.
Agitados e tensos, devido á fama de valente do mulato guerrilheiro baiano, adepto da Umbanda, filho de Oxóssi, os policiais detonaram uma fuzilaria intensa no negror da noite que causou várias mortes, além da do “inimigo número um” do regime militar (1964/85).
O rififi oficial causou a morte da investigadora Estela Morato, que “namorava” o delegado Fleury no carro-piloto; um inocente protético alemão que cruzava a Alameda Casa Branca na hora errada; e o coordenador da operação, o delegado Rubens Tucunduva que contraiu um câncer e faleceu mais tarde.
O relatório oficial registrou:
“… vendo-se cercado pelos policiais, tentou resistir procurando abrir a pasta, ocasião em que foram feitos disparos, principalmente contra sua mão esquerda, dois dos quais o atingiram em região mortal”.
Como nos filmes de faroeste, em que o bandido tinha os dedos estraçalhados, o relatório foi uma bela peça de ficção.
Nenhum tiro foi disparado por Marighella, concluiu a perícia.
A versão policial escondia a versão sumária da vítima, driblando uma complicação extra do violento episódio: a suspeita de que o “fogo anigo” tenha causado as outras mortes.
O delegado Tucunduva, desafeto de Fleury, acabou baleado na virilha.
Zorra total.
Existem pelo menos três versões conflitantes sobre o episódio.
Segundo os militares, Marighella foi varado por uma rajada de metralhadora no banco de trás do fusca dos freis dominicanos, após ter reagido á ordem de prisão dada por Fleury.
A segunda versão é a dos religiosos usados como “isca” para atrair Marighella.
No julgamento, os frades disseram que o comandante da ALN foi executado no meio da rua, longe do carro onde estavam.
Por fim, o Grupo Tortura Nunca Mais, em 1996, adotou as conclusões do laudo em que legistas garantem que Marighella foi morto com um tiro no peito, á queima-roupa, que seccionou-lhe a veia aorta, além de ter recebido outros três disparos.
O advogado de presos políticos Mário Simas declarou:
“No processo, lancei dez dúvidas sobre a versão oficial que nunca foram respondidas pelo Estado”, afirmou o ex-presidente da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo.
“O delegado Fleury era um caçador sem escrúpulos, que não respeitava nada para chegar a seus objetivos”.
Palavras-chave: ditadura militar brasileira; morte de Marighella.
*João Teixeira, jornalista e escritor, é membro do Conselho Editorial do Jornal Contratempo.