COISAS DO BRASIL “O Portugués do B” – Por João Teixeira
“Eu conheci uma dona boa, lá de Cascadura, boa criatura, mas não sabe ler nem tampouco escrever…”
” … vi uma letra O bordada em sua blusa, eu perguntei seu nome, ela me disse Orora, sou filha do Arineu…”
A música popular já rendeu tributo a esta instituição nacional – o analfabeto – neste hilário samba de Gordurinha, gravado por Macalé, nos anos 70.
A escola da vida oferece lições inesquecíveis. Há tempos, durante o encontro de um movimento social na periferia de São Paulo, alguém soltou a bomba: era impossível entender o que diziam os intelectuais.
“… mas ela é bonitona, bem feita de corpo e cheia da nota, mas escreve gato com j e saudade com c, pra você ver…”
“Vocês falam muito difícil!” – a ignara lançou o petardo que nos deixou perplexos.
Bem, como sempre, o buraco era mais embaixo.
O surrealismo da situação, verdadeiro diálogo de surdo com mudo, escancarava nosso isolamento e o abismo social em que vivemos.
“… ela me disse outro dia que estava doente, sofrendo do estrombo, ah, eu levei um tombo, caí durinho pra trás…”
Assim como a Natureza não dá saltos, ninguém muda ninguém que não quer ser mudada.
Era difícil deixar de ser um intelectual inútil, destes que pululam por aí exibindo seus brasões e diplomas, sem compartilhar o saber com os que mais precisam dele.
“… aribu, aeroprano, motocicreta, diz que adora feijoada compreta, é errada demais…”
“…ceis precisa falar mais fácil!” – completou a inculta porta-voz do grupo.
Propôs, em suma, a adoção do Português do B.
Na sociedade de castas, a fala culta, correta, o Português do A, deveria ser exclusiva dos letrados.
O Portugues do B, subproduto do primeiro, errático e errôneo, acessível e barato, continuaria exclusivo da massa iletrada.
“Existe um livro chamado dicionário que explica o significado das palavras, é só tirar a bunda da cadeira e consultar” – reagimos á estultice da sabedoria popular.
Em vão.
“O que eu ganho com isso?” – o sentido utilitário falou mais alto.
Montamos uma biblioteca onde ninguém pôs os pés, a não ser nós mesmos.
Por fim, o líder do movimento, que queria apagar “o lábaro que ostentas estrelado… e encurtar o Hino Nacional que ninguém sabia cantar inteiro, radicalizou: pagaria a escola de quem quisesse estudar.
Poucos se animaram a tanto.
Uns e outros aproveitaram chance para embolsar alguns trocados. Sem estudar.
Sou agradecido a estes ignorantes que surgiram no meu caminho.
Eles me ajudaram a entender porque hoje advogados, médicos, professores, jornalistas, artistas, políticos e governantes, apresentadores de TV e influenciadores digitais cometem erros crassos da língua pátria.
O mal foi banalizado.
A educação no Brasil é um desastre de trem no túnel escuro.
Palavras-chave: coisas do Brasil; o Português do B.
João Teixeira Sp: …