A psicologia de massas do fascismo, mais uma vez

O termo psicologia de massas se refere aos estudos da Psicologia de grupos sociais específicos, como uma categoria profissional ou uma classe social, buscando os caracteres gerais e não as diferenças individuais. A obra “Psicologia de Massas do Fascismo” de Wilhelm Reich, busca compreender os processos envolvidos na ascensão do nazifascismo e, para isso, foi necessário abandonar concepções da época. Acreditava-se que a população fora acometida de uma “psicose hitlerista”, em que se deixara levar por uma espécie de delírio, tendo o Führer como seu maior símbolo. Reich defende que é preciso compreender as condições ideológicas específicas e como essas constituem a estrutura psíquica das pessoas.

É chocante se dar conta de que as pessoas aderiram entusiasticamente a uma ideologia explicitamente genocida e que usava de violência não somente contra supostos inimigos externos, como também contra seu próprio povo que a apoiava. A situação de exploração e miséria não necessariamente leva à consciência da opressão que se sofre. Por isso, a conhecida colocação de Reich: “O que se pretende explicar não é por que motivo o esfomeado rouba ou o explorado faz greve, mas por que motivo a maioria dos esfomeados não rouba e a maioria dos explorados não faz greve.” (p. 38)

Reich critica o marxismo da época, denominado por ele como “marxismo comum”, por buscar explicações para a ascensão do nazismo em hipóteses distantes da realidade psíquica das massas. Falava-se em “psicose hitleriana”, bem como tentava-se apelar para uma esperança no futuro, quando o povo se levantaria e esmagaria o Estado totalitário; essa previsão jamais se concretizou. O nazismo foi derrotado ao final da Segunda Guerra, pelo grupo dos Países Aliados, liderados por URSS, EUA e Grã-Bretanha.

Diante da onda fascista (ou de algum fenômeno social cujo potencial destrutivo é evidente), verificam-se algumas posições básicas, que tanto constituem posicionamentos políticos que se sustentam, quanto posicionamentos que se sucedem (o fator, aqui, é a adesão mais ativa e consciente a um grupo político e o posicionamento predominante em um determinado ambiente): uma minoria que se opõe de forma consciente; ocorre um processo quase generalizado de resignação diante dos fatos; por fim, uma adesão fervorosa à “guerra”, à “destruição dos inimigos”, por parte das classes médias e trabalhadoras.

Na prática política, é decisiva a distribuição ideológica e não a econômica. A ideologia também repercute sobre as condições materiais (trata-se de uma relação dialética, de constituição recíproca); ela iinsere a estrutura econômica na estrutura psíquica. Trata-se de uma dupla influência sobre as classes sociais no capitalismo: da estrutura econômica e da estrutura ideológica. Essa relação é contraditória e essa contradição irá se revelar em sua estrutura psicológica. Isso constitui uma força material, pois as massas agirão de forma contraditória (contradição entre sua situação econômica e sua ideologia). O trabalhador médio não é nem marcadamente reacionário, nem revolucionário. A classe média também apresenta contradição semelhante, colocando-se contra o “sistema”, mas agindo de forma notoriamente reacionária.

Como afirma Reich: “A clivagem entre a situação social das massas trabalhadoras e a sua consciência dessa situação implica que as massas trabalhadoras, ao invés de melhorarem a sua posição social, ainda a agravam. Foram exatamente as massas reduzidas à miséria que contribuíram para a ascensão do fascismo, expoente da reação política.” (p. 31)

Uma situação desesperadora não necessariamente leva à revolução ou à consciência. Seja essa situação a fome, a guerra ou uma pandemia.

 

As citações são da 2a edição brasileira, da Editora Martins Fontes, publicada em 1988.

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