Crônica: “A Órbita dos Insetos” Jair Vivan Jr.

O pio forte e alargado feito um grito ardido e repetitivo do anu branco, interferindo no canto insistente e intermitente das cigarras machos ouriçadas para acasalar, anunciava um fim de tarde movimentado.

Em cada rasante o anu levava no bico um daqueles insetos cantadores ainda em busca de um tronco em seu quase sempre fatídico voo desengonçado.

Talvez a escassez de pererecas que adentravam o mato em busca de novas águas e os calangos entocados nos dormentes nos barrancos demarcando a linha do trem, forçassem a presença do anu em nosso convívio semi urbano em busca de alimentos, quando se interessavam também pelas içás e outros insetos mais encorpados que compunham nosso espaço.

Nessa busca desenfreada por alimentos, um salve-se quem puder da fome, também tínhamos nossa participação, ficávamos com as içás fêmeas, as tais tanajuras que já não voavam e dispunham de sua farta anca as quais abundavam após um dia chuvoso de verão e já tinham sido capturadas e reservadas para uma futura fritada na banha de porco.

Machos que viravam presas acabavam servindo de ventiladorzinho, com o zumbir dos batimentos de suas asas, se espetados em um palito pontiagudo.

Assim seguia o final da tarde quente dando lentamente a vez à outros sons, desta vez a abertura sonora seria por conta dos grilos, seguidos pelos notívagos morcegos e curiangos orquestrando o escurecer que precederia o sinistro silêncio da noite, com seu espaço já composto pelos pequenos insetos, tipo besouros e aleluias, brindando a evolução que os agraciou com a iluminação artificial.

Enquanto observava o piscar dos parcos vagalumes que perdiam seu brilho conforme se aproximavam da iluminação incandescente do poste, eu imaginava como deveria ser a vida desses insetos antes da luz elétrica. Será que orbitavam os vagalumes como fazem nas lâmpadas?

JVivanJr.

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