Crônica: Vivendo e Apanhando por Jair Vivan Jr.
Era de lei apanhar, até mesmo para fazer valer a lei. Surra de mãe era leve, normalmente de chinelo, mangueirinha de chuveiro, varinha de marmelo, fio de ferro e tal. Já as de pai eram de rabo de tatu, cinta e dependendo da gravidade do lado da fivela, salto do sapato, ripa, cabo de vassoura e muito mais.
Brigas na rua eram comuns, mas para chegar em casa contando tinha que ter batido, se tivesse apanhado, levava uma surra do pai para aprender a bater na próxima vez, no caso se não tivesse ficado marcas era melhor nem contar.
E assim éramos educados, violência gerando violência, aprendíamos que ganhava uma briga quem desse o primeiro tapa na cara do adversário causando certo desequilíbrio e às vezes levando-o à desistência, aí era só gozar da fama, era temido já de chegada, principalmente se tivesse batido em outro também afamado.
Alguns assuntos quando se agravavam tinham que ser resolvidos entre grupos, para tanto vivíamos em turmas, geralmente com mais de três pessoas, mas chamadas de trincas que se formavam nos bairros ou regiões e resolviam as diferenças na porrada.
Literalmente na porrada, pois eram usados porretes de pau, pedras, soco inglês improvisado, cabo de aço de freio de bicicleta, eficientes quando usado no giro e mais alguns artefatos de briga, mas que não se caracterizavam como armas.
Tanto era cultural bater e apanhar, que já éramos estimulados na escola, quando levávamos puxões de orelha e reguadas por errar as lições e se o erro fosse grave, levava puxão nas pelugens da costeleta do cabelo por doer mais, comentava-se que batiam com amor, era para o nosso bem, apanhávamos e éramos humilhados quando fazíamos arte ou passávamos de algum limite e não cabiam reclamações.
No curso de admissão, como uma pseudo técnica de ensino, além de bater o professor colocava de joelhos no milho ou em tampinhas de garrafa viradas para o lado franzido que ficavam cravadas no mole do joelho, quando notava desinteresse ou dificuldade no aprendizado.
Apanhava do sargento no TG, sem direito a reação ou revide, apanhava e tinha que responder: – Sim senhor. É quando tentam nos ensinar a apanhar, agradecer e ficar quieto.
Nas brigas dos bailes de clubes que acabavam dividindo o publico em dois grupos, apanhávamos e batíamos, dependendo da briga, acabávamos nem sabendo se tínhamos batido ou apanhado mais.
E seguimos na vida apanhando, revidando, batendo, caindo, se levantando e nisso tudo acho que aprendemos mais apanhar do que bater, pois minha geração enquanto pais, não exerceu esta prática com os filhos e nem os estimulou para que resolvessem as questões com brigas ou violência, mesmo porque atualmente um pai ou qualquer adulto que agrida ou desencaminhe um menor pode responder criminalmente.
E ai do professor que ouse ao menos olhar feio para uma criança hoje em dia.
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JVivanJr.
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Nota do editor
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