“Permíta-se”, na crônica de Don Xikote – Por Cícero de Pais

“Permíta-se” – Do livro Jardim Imaginário

Permíta-se o silêncio. Não um silêncio qualquer, contaminado pelo ronronar das máquinas mortíferas e dos fogos de artifício, quando todos comemoram um ano que nunca terminará. Permíta-se um silêncio imune ao medo das ondas que afundam os barcos dos pescadores e riscam do mapa as cidades construídas nas praias, quando tudo era seguro e o futuro nos reservava um oceano de raras oportunidades.
Permíta-se sonhar. Mesmo que não valha nada para muitos as utopias que você traçou, enquanto observava a sua estrela da sorte, entre todas as estrelas que aprendeu a amar, ouvindo soul, mozart e rock and roll, num tempo em que mudar o mundo era tão simples e trivial.
Permíta-se viver. Não uma vida qualquer, mas a vida que você escolheu, a vida passível de alegrias e tristezas, que faz de você alguém tão especial e mesmo que o mundo seja impossível de suportar, você dirá: venci !
Permíta-se o Amor. Não um amor insípido, mas aquele amor que transcende tudo o que já foi escrito sobre as paixões avassaladoras ou simplesmente o amor pela beleza de uma simples gota de orvalho brilhando ao amanhecer.
Permíta-se o silêncio, sim.
Sem os gritos das sirenes, trovões, tiros em Hollywood ou na Rocinha, sem os gritos dos pastores midiáticos, as bestas do apocalípse e as manchetes que mancham de sangue a alma dos espectadores perplexos e passivos, acorrentados aos confortáveis sofás, enquanto, lá fora, a realidade dita as suas regras e expõe em cores melodramáticas a última notícia, as lágrimas e o grito de horror no jornal da tarde.
Permíta-se o silêncio.
Ele viu nascer e morrer impérios, civilizações, sistemas planetários e tudo o que conhecemos ou consideramos inimaginável será apenas um aceno na memória do Tempo.

( D. X )

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