Precisamos falar sobre: Ourinhos tem frequência assustadora de casos de suicídio

Na manhã desta quinta-feira, 24, mais um jovem, vítima de depressão, cometeu suicídio em Ourinhos. Em menos de trinta dias, é o terceiro caso de suicídio na cidade.

Um dia antes, na quarta-feira, 23, a roda de conversa aberta ao público, “Precisamos Falar Sobre Suicídio”, aconteceu na EMEF Racanello e reuniu ourinhenses interessados pela conscientização e o combate ao suicídio. O evento foi organizado por um grupo de ourinhenses que percebeu a necessidade da conversa e do entendimento sobre o assunto, devido à frequência assustadora de casos de suicídio em Ourinhos e na região, principalmente entre jovens adultos da faixa dos 18 aos 30 anos.

O Jornal Contratempo, com a colaboração do psicólogo, professor e colunista, Luiz Bosco, vem analisando as condições e os casos de suicídio em Ourinhos para divulgar e construir uma discussão colaborativa sobre o tema. A análise sobre as ocorrências na região e os índices de suicídio no Brasil mostram especificações significativas entre os grupos sociais que mais sofrem com esse problema; também nos levam à reflexão sobre como os fatores socioculturais interferem nas taxas e formam um padrão sobre as pessoas que mais são atingidas pelo pensamento suicida.

Segundo dados do Ministério da Saúde, parte expressiva dos casos se concentram entre homens (9,2 casos por ano para cada 100 mil habitantes). Para mulheres, a taxa é de 2,4 casos por ano em cada 100 mil habitantes. Esta concentração, da maioria dos casos entre homens, deixa Ourinhos dentro do índice nacional — os três casos nos últimos 30 dias aconteceram com homens. Porém, quanto a quantidade de casos de suicídio, Ourinhos, em 2019, está acima da média.

“Homens entre 15 e 29 anos são as maiores vítimas de homicídios e acidentes de trânsito. Juntando-se isso aos números de suicídio, devemos pensar em quão tóxicos podem ser os elementos culturais que definem a masculinidade brasileira. […] Os dados do Ministério da Saúde mostram importante relação entre os suicídios entre homens e o desemprego, o que também tem relação com o que afirmei. O homem se sente provedor da casa e na obrigação de assegurar uma posição social. O desemprego envergonha, gerando intensa culpa e o desespero diante de uma realidade social que se ampliou desde 2016.” afirma o professor.

O suicídio entre mulheres também está relacionado aos elementos destrutivos da cultura machista brasileira, o maior fator associado na população feminina é a violência doméstica. “Não podemos dizer que o grande problema do suicídio no Brasil seja a cultura machista, mas é um fator que não pode ser deixado de lado se quisermos compreender o problema”.

“As dificuldades generalizadas pela desigualdade social atingem a todos e também fazem parte do problema: mais de 70% dos suicídios no mundo ocorrem nos países “em desenvolvimento”. Outros fatores importantes são o alcoolismo, uso de outras drogas e transtornos psiquiátricos. É preciso salientar que nem sempre uma pessoa que tente ou cometa suicídio apresentará uma dessas características; são dados estatisticamente relevantes para compreendermos o problema, mas uma pessoa próxima pode não apresentar nada do que expus até aqui e precisar de ajuda assim mesmo.”, acrescenta Luiz Bosco.

Atenção aos sinais — Na maioria dos casos, a pessoa planeja por algum tempo o suicídio e pensa em distintas formas de fazê-lo, como iria comunicar às pessoas e qual a reação delas depois de cometido.

Segundo o Ministério da Saúde, os sinais envolvem mudanças bruscas em diversos comportamentos, como na higiene pessoal e alimentação; distanciamento da família e amigos; perda de interesse por atividades das quais gostava; afirmações de se ver como um “peso”, um “inútil”; falar sobre o suicídio como se fosse “uma saída”; brincadeiras bizarras sobre o suicídio.

Esses indícios também podem estar associados a outras situações de sofrimento mental. O importante é que, ao percebermos alguns desses elementos, procuremos conversar com a pessoa de maneira franca, sem hostilizá-la, nem culpá-la. É preciso ouvir sobre seus sofrimentos e ajudá-la a procurar ajuda profissional, de um psicólogo ou psiquiatra.

No entanto, como o suicídio expõe as dificuldades humanas na relação com a morte, é muito comum ouvirmos que
“ninguém percebia” que um suicida estava prestes a dar fim à própria vida. No caso do suicídio intempestivo, cometido sem planejamento, diante de um momento “oportuno”, pessoas que pensavam no suicídio e nunca tiveram coragem de realizá-lo, diante de uma oportunidade fácil, podem levar adiante o que até então parecia uma ideia distante — aliás, essa é uma das preocupações sobre ampliação do acesso a armas de fogo.

Como lidar — Para o professor Luiz, no que diz respeito ao suicídio, está quase sempre presente a dificuldade de perceber que o suicida vinha sofrendo.

Precisamos alimentar a proximidade entre as pessoas. O diálogo olho no olho, sem mediação eletrônica, ao vivo, é o mais importante para a vida do ser humano. É aí que percebemos suas reais necessidades, seus medos, seus desejos e aflições.

O diálogo com as pessoas que amamos precisa ser franco, com menos julgamento, mais compreensão e atenção às reais necessidades de cada um. Muitas pessoas se afastam de alguém próximo quando percebe que ele está em situação de sofrimento mental. Afastam-se por desconforto e por receio.

É nesse momento que mais precisamos nos aproximar e permanecer ao lado dessa pessoa, mesmo que ela se apresente rude, fugidia ou indiferente. Se for difícil estabelecer essa proximidade, podemos pedir ajuda pra alguém: um amigo, um familiar ou um profissional. O importante é não cairmos no erro de “deixar pra lá” a pessoa, esperando que as coisas se resolvam por si só. Às vezes, é “só um momento” e realmente passa. Mas pode ser que não aconteça isso. Logo, o melhor é sempre estar por perto e alimentar laços de aceitação, fraternidade e igualdade.

Como uma forma de apoio e incentivo à conscientização, as rodas de conversa sobre suicídio em Ourinhos serão planejadas quinzenalmente. Um grupo no WhatsApp também foi criado para a discussão sobre o assunto e pode ser acessado por meio do link:

https://chat.whatsapp.com/Dp9rJGzjl2e0vQHqRa8YbH

 

APOIE

Seu apoio é importante para o Jornal Contratempo.

Formas de apoio:
Via Apoia-se: https://apoia.se/jornalcontratempo_apoio
Via Pix: pix@contratempo.info