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Eleições, política e ficção científica

Eleições, política e ficção científica

No mês passado, o mais famoso serviço de streaming, Netflix, lançou a série Stranger Things. Foi feita com 8 episódios, e se passa em uma pequena cidade do interior do estado de Indiana (EUA), chamada Hawkins. A série é dirigida pelos irmãos Matt Duffer e Ross Duffer. Além de fazerem várias referências a filmes como “E.T. – O Extraterrestre” (1982) e “Allien, O oitavo passageiro” (1979), traz uma atmosfera típica e caricatural da década de 1980.

Com trilha sonora regada à David Bowie, Toto, The Clash e outros mais, a série também faz uma criativa miscelânea entre ficção científica, terror, suspense, melodrama juvenil e comédia para crianças. Uma temática bem explorada e central na obra é o tema do “inimigo externo”, eixo central em um mundo dividido pela Guerra Fria (1957-1989).

Dentro deste contexto o cinema hollywoodiano explorou as variadas possibilidades de se utilizar monstros, psicocinética, laboratórios longínquos e diversos outros elementos que pudesse criar um nascedouro de inimigos e tirar o foco da população dos problemas internos do país. Os soviéticos eram a ameça. Fez-se de tudo para eliminá-los.

À época vivíamos no Brasil com o lema da “segurança nacional”, onde tudo oque fosse rotulado como ameaça comunista era aniquilado e extirpado pelo Estado. O problema era o “outro”, o “de fora”. Alerta vermelho! Anos antes, em 1976 houve o Mundial de Clubes na Argentina, controlado pelos “Dinossauros” (apelido dado pela oposição aos militares que estavam no poder naquele país). Para unificar a nação os “hermanos” criaram também o seu inimigo externo e foram à guerra reivindicar as “Ilhas Malvinas”, lutando contra o Reino Unido. “O problema estava fora do continente”.

Outra série que trabalha com brilhantismo essa complexa bolha imagética do capitalismo x comunismo, é The Americans. Esta última retrata agentes da KGB (Serviço Secreto da ex-União Soviética) infiltrados no cotidiano do american way of life.

Politicamente, como já sabemos, existia essa dicotomia que “facilitava” por um lado a reflexão e o posicionamento ideológico, mas que hoje sabemos que na verdade a coisa não era assim tão simples já que o jogo geopolítico fora bastante complexo. Atualmente impera a multipolaridade, ou seja, não há apenas dois núcleos imperialistas que emanam poder e regras. Tudo pode variar.

Mesmo com um cenário fragmentado em que estamos vivendo neste Brasil de interinos e interinas, e após a queda do Berlin Mauer (Muro de Berlim), ainda em terras brasilianas se joga e se cria dicotomias: PSDB x PT, coxinhas x petralhas, avanço x retrocesso.

Com o cenário de eleições municipais se aproximando em várias cidades do país, burocracias aparelhadas estão sendo ameaçadas e adivinhem qual é a principal linha argumentativa? O perigo do retrocesso! Preferem atacar o outro a buscar solucionar os seus próprios problemas. Acham que o inimigo é externo (outro partido e candidato), mas não o é. É interno, como sempre foi. Mas deixem que se autodestruam numa guerra medíocre que apenas alimenta cegueiras, falta de argumentação e projetos de gestão ultrapassados.

Muitos querem apenas o poder pelo poder. Como disse Karnal, “o ódio é lugar quentinho, mas estéril”. E como disse este mesmo filósofo: “ele denuncia apenas sua dor e seu medo”. Por isso que nos filmes de ficção científica dos anos 80 se utilizou tantas criaturas exóticas para dar nome e lugar a problemas que não se queriam resolver internamente.

Será que misturando eleições, política e ficção científica alguém terá a ideia de criar um animal gosmento, grande e com vários dentes, com poder de detectar corruptos, incompetentes aparelhados, demagogos e aberrações humanas, engolindo falsos prefeitos, vereadores e seus asseclas? Provavelmente não cortaríamos os nossos problemas pela raiz, mas já nos ajudaria bastante.

André R. da Silva é licenciado em História, trabalha com Cultura e adora tocar bateria.

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