Professores contratados se sentem abandonados com a condição de trabalho
Profissionais adquirem aula quando sobra ou quando é preciso cobrir falta de outro professor
Juliana Neves
Entre os professores estaduais há uma classificação, uma divisão de categorias com o objetivo de fragmentar qualquer tipo de luta, de reinvindicação e anseio. Em resumo, esta divisão serve para que o professor não se veja como um trabalhador e simplesmente como alguém que ocupa espaço em alguma categoria.
“O professor se vê como uma pessoa que não pertence a esse mundo. E essas categorias, de fato, destroem qualquer tipo de luta e é algo pensado, talvez, pelo governo no sentido de fazer de conta que está dando oportunidade para um grupo entrar na escola e acaba piorando a educação de forma geral. Porque o professor de categoria V, por exemplo, ele não tem continuidade e não tem possibilidade de levar a diante algum projeto, a acolhida da escola é difícil”, explica Thiago de Brito Rodrigues, ex professor de categoria V e agente de combate às endemias.
Dentro destas categorias há a categoria O, que são os professores contratados. É a tipologia do profissional contratado por quatro anos que o governo estadual não garante aulas, somente quando sobra. Atualmente, é atribuído no mínimo 19 aulas ao professor distribuídas nas escolas. Por exemplo, três em uma escola, seis em outra e dez em outra diferente.
Segundo Paulo Ricardo Nunes Faria, professor contratado, o profissional vive sua carreira baseada na insegurança, pois pode perder suas aulas a qualquer momento quando são adquiridas. “Se é substituição pode pegar aulas por tempo determinado. Depois disso, mesmo com contrato aberto, o professor está desempregado. É humilhante o jeito que o governo trata os professores contratados, não tem plano de carreira, pode dar aula a cinco- dez anos que o salário será o mesmo e não tem plano de saúde. E mesmo trabalhando o ano todo só tem direito a duas faltas abonadas, que por lei seriam seis”, conta Paulo.
Uma das consequências negativas do professor contratado possuir um trabalho desgovernado, além das questões pessoais de vida, é da não possibilidade de estabelecer relações com os alunos, um laço afetivo por sempre estar trocando de escola.
É uma condição que pode dificultar o trabalho, porque quando aluno e professor se conhecem é mais fácil de amenizar as dificuldades do estudante, é mais fácil de compreendê-lo e ajudá-lo em sala de aula para absorver a totalidade do conteúdo do ano letivo.
Na opinião de Thiago, que é semelhante, ser professor contrato ou de outra categoria significa luta, desespero diário por não saber o que será de si próprio no dia de amanhã, se será aceito pela escola ou não, não participa do planejamento da escola e se sente refém da situação.
Inclusive, é possível que o professor tende a atender determinada escola mais que outra, mesmo sendo prejudicado economicamente. Afinal, a quantidade de aulas que o professor recebe é um valor em uma escola e outro em escola diferente por dia, tendo que sair correndo de uma cidade para outra ou dentro do próprio município. E o governo “ajuda” somente com uma passagem de ida e uma de volta por dia trabalhado.
“Avalio que a situação dos professores é precária em qualquer sentido. Não há vale alimentação e somente o “direito” de vale transporte, em período de férias não recebe salário e recebe o 13º proporcional a quantidade de aulas dadas no ano. Ou seja, é desestimulante e o professor procura outras fontes de renda, não prepara aula e prefere trabalhar no caminho mais fácil e, muitas vezes, a aula que será ministrada não será da área do professor, é simplesmente um tapa buraco que se não cumprir o que a escola pedir o profissional não serve para a instituição de ensino. No final do mês, a tristeza domina o ser humano por não ter chegado nem na quantia de salário-mínimo. Não há contrapartida, não há estímulo, somente a paixão de dar aula, de estar com os alunos e poder ensinar, fazer algo pela educação mesmo que só uma andorinha não faz verão”, fala Thiago.
Portanto, é um paradigma ser uma pessoa formada para formar outras pessoas e não poder dar o seu máximo, não poder fazer parte da escola de forma efetiva e só cumpre horários burocráticos, não tem direito a greve. O professor se sente abandonado e o profissional precisa manter a sua luta para começar a se enxergar como trabalhador realmente e não meramente uma categoria ou grupo.
E em contato com o a sub-sede do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP) de Ourinhos, Luís Horta, diretor estadual e coordenador regional, diz que o sindicato, desde a promulgação da Lei 1093/2009-governo José Serra, vêm denunciando e lutando em esferas políticas e judiciais com o objetivo de derrubar a forma de contratação dos professores temporários na rede pública estadual.
“Esses profissionais, que cursaram uma ou mais faculdades de licenciatura, que em sua maioria possuem pós-graduações que os especializam nas áreas que atuam, são obrigados, pelas regras atuais, a se sujeitarem a uma legislação que viola o princípio constitucional da isonomia, ou seja, esses colegas, apesar de desempenharem as mesmas funções e terem as mesmas responsabilidades dos professores efetivos ou estáveis, não são contemplados com os mesmos direitos previstos no Estatuto do Magistério. Alguns incautos, ou mal informados mesmo, acabam difundindo a ideia de que esses colegas se sujeitam a essa aberrante contratação por não conseguirem passar em um concurso público, o que é uma inverdade absurda: O Estado, segundo os últimos dados divulgados, mantém cerca de mais de 36 mil de professores nessas condições e não chama um concurso público desde o ano de 2013, ou seja, se não há concurso como o professor pode passar?”, fala Luís.
Sendo assim, o sindicado tem defendido esta mudança contratual com base na Lei 500/1974 que estende os mesmos direitos que beneficiam os professores efetivos e estáveis. Com isso, já existe um Projeto de Lei Complementar (PLC 15/20) em tramitação na Câmara dos Deputados que precisa ser votado pelos parlamentares estaduais e ser sancionado pelo Executivo.
E, de acordo com o coordenador, “na esfera judicial, o Sindicato vem denunciando as irregularidades e inconstitucionalidade da forma atual de contratação e a não realização de concursos públicos de professores no Estado de São Paulo que, também, é considerado igualmente ilegal e uma irresponsabilidade do governo paulista”.