Manifestantes fazem passeata em Santa Cruz e pedem justiça por morte de jovem em Ourinhos
“A gente quer ele preso. Ele não merece estar na sociedade. Ele matou meu filho e pode matar o filho de qualquer um. A única coisa que eu devo para o meu filho é a justiça”, pede a mãe do jovem morto, Valdinéia Pontes.
Parentes e amigos caminharam do Parque das Nações, bairro onde Bryan Bueno morava, até as principais ruas da cidade. A passeata virou também uma carreata, motociclistas e motoristas passaram a acompanhar o protesto.
Testemunha ameaçada
A passeata em protesto contra a morte de Bryan aconteceu uma semana após uma testemunha do assassinato registrar um boletim de ocorrência contra policiais militares por supostas agressão e intimidação. O caso teria acontecido no último domingo (31) em Santa Cruz do Rio Pardo.
Wesley Valheiro Morais, de 18 anos, estava no banco traseiro do carro quando Bryan morreu. Ele presenciou a abordagem dos policiais na saída da festa e o momento em que o soldado Luiz Paulo Izidoro atirou contra Bryan, que estava no banco do passageiro da frente.
Segundo o delegado Renato Caldeira Mardegan, que investiga o caso, a vítima disse chegou a ser agredida. “Ela [a vítima] alega que estava em um evento na cidade e foi abordada, e nesta abordagem teria sido reconhecida como testemunha do caso ocorrido no mês passado em Ourinhos. E ela teria sido hostilizada pelos policiais. No final da abordagem, após sofrer ameaças e ofensas, ela teria sido agredida com um soco”, diz o delegado.
Wesley já depôs na ouvidoria da Polícia Militar incriminando o policial que fez o disparo e, segundo o delegado, o jovem acredita que a atitude dos policiais de Santa Cruz do Rio Pardo, cidade vizinha a Ourinhos, foi pra intimidá-lo no processo.
A Polícia Civil investiga o caso como injúria, ameaça, coação e abuso de autoridade. O rapaz e duas testemunhas foram ouvidas. Segundo o delegado, os policiais que trabalharam no dia também serão ouvidos para os suspeitos serem identificados. Também foi solicitado a ficha clínica de Wesley no dia que teria passado por atendimento médico para anexar à investigação.
O Condepe, Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana, que tem acompanhado e prestado apoio juridico à familia de Bryan, informou que estuda solicitar que o Wesley seja incluído na lista do programa de proteção a testemunhas do estado. Em nota, a PM informou que instaurou um Inquérito Policial Militar para a devida apuração e esclarecimento do ocorrido.
Inquérito apontou homicídio doloso
O inquérito da Polícia Civil foi concluído no dia 7 de julho. Luís Paulo foi indiciado por homicídio doloso, por ter assumido o risco de matar ao abordar o jovem com arma em punho e apontada para a vítima, e duplamente qualificado, pois, de acordo com inquérito, ele não deu condições de defesa à vítima e por motivo fútil, informou a polícia.
A Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público e da Polícia Civil contra o policial militar, mas na decisão, a Justiça rejeitou o pedido de prisão preventiva feito pelo MP e com isso o policial vai responder em liberdade.
O policial alega que o tiro foi acidental, versão também sustentada pelo comando da corporação. O policial que atirou e matou o jovem prestou depoimento à Polícia Civil e não quis dar entrevista na época da ocorrência, mas segundo o advogado dele, Osny Bueno de Camargo, o disparo foi acidental e provocado por um defeito na arma. “A versão única e exclusiva e que é a verdade. A arma disparou acidentalmente. Essa arma tem apresentado no Brasil inúmeros defeitos”, explica Osny.
O advogado afirmou também que a abordagem foi feita obedecendo às normas de conduta da Polícia Militar. “Operação padrão de quem não respeita a ordem que foi dada, que era para descer do carro. Eles desobedeceram e é assim que o policial tem que abordar, armado. É para isso que existe a polícia.”
De acordo com o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condeph) que teve acesso ao interrogatório, o policial disse ao delegado que a arma estava em posição sul, ou seja, apontada para baixo e o dedo não estava no gatilho, no entanto, a arma disparou. Ainda segundo o órgão, o policial disse também que os jovens desobedeceram a ordem de sair do carro.
Laudo diz que arma não apresentou defeito
Em nota, a PM informou que mantém a posição de homicídio culposo, sem intenção de matar, pois em nenhum momento houve a intenção policial em cometer aquele ato. Ainda segundo a nota, também não foi o caso de assumir o risco, pois deveria haver dolo em sua ação, mas não houve, foi uma fatalidade. A PM considera como uma posição totalmente equivocada esse indiciamento da Polícia Civil.
Para Polícia Civil, além de assumir o risco de matar pela forma como foi feita a abordagem, o policial também colocou em risco a vida das outras pessoas que estavam no veículo e não dando a chance de defesa de Bryan.
Investigação
Segundo a Polícia Civil, ações da PM, como a tentativa de apagar o vídeo da abordagem, a lavagem do carro das vítimas e demora na entrega da arma, dificultaram as investigações. O comando da PM rebateu essas alegações.
“O veículo estava bastante ensanguentado, então eu determinei que ele fosse lavado para que os jovens pudessem ir embora com o mínimo de conforto. Mas quero deixar claro que só fiz isso após o veículo ser devidamente liberado pela perícia. Já o armamento assim que recebemos enviamos para a perícia local. O que eu acredito que está causando essa dúvida se nós apagamos ou não apagamos [as imagens] seja a incapacidade técnica de outras pessoas de extraírem esse material do equipamento, mas não apagamos nada, as imagens estão lá”, esclareceu a tenente coronel da PM, Cenise Araújo Calanans.
Entenda o caso
Bryan morreu baleado durante uma abordagem da Polícia Militar, na madrugada de 9 de junho. Segundo informações da Polícia Militar, o carro andava em zigue-zague e um dos meninos teria derrubado alguns cones de sinalização.
Dois policiais pediram para que o carro parasse. Bryan estava no banco da frente, do lado do motorista, e levou o tiro de um dos policiais. “O policial não declara que fez o acionamento desse gatilho. Ele declara um recuo diante desse esboço de reação da vítima. E nesse recuo que ele fez, com esse passo para trás, que ele teria dado esse disparo”, explica a comandante do Batalhão da Policia Militar de Ourinhos, Cenize Araújo Calasane.
O jovem, que morava em Santa Cruz do Rio Pardo, foi atingido no pescoço. Ele foi socorrido pelo Samu, mas chegou já sem vida na Santa Casa.