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ERA DE CHUMBO: O Lobo e o Porquinho no fim de Chandler.

ERA DE CHUMBO: O Lobo e o Porquinho no fim de Chandler.

Por João Teixeira (Colunista)

O Dr. Porquinho – apelido que o delegado do Dops Alcides Cintra Bueno Filho tinha nos bastidores – atuava com desenvoltura e em raia própria na guerra revolucionária em São Paulo.
Baixo, mal vestido e atarracado, o beato-queixada ganhou o apelido porque andava lambuzado de óleo das coxinhas que devorava, cumprindo tarefas obscuras que a maioria absoluta das demais autoridades ignoravam no templo sombrio do terror estatal.
Quando presidiu o inquérito policial sobre o fuzilamento do capitão Chandler, do Exército norte-americano, o ato de contra-propaganda revolucionária executado pela VPR de Onofre Pinto, Carlos Lamarca e Pedro Lobo, os militares punidos no golpe civil-militar de 1964, os guerrilheiros das “armas que combateram as armas”, o supracitado Dr. Alcides, como dizia -se então, lavou a égua.
No dia 8 de outubro de 1968 , um ano após a execução de Che Guevara, na Bolívia, em meio á Semana de Solidariedade ao Vietnã.
Neste dia, Chandler não saiu de casa e escapou da morte.
Mas não no dia 12, aí foi fatal, quando Marquito, Diógenes e Lobo praticaram a sangrenta “justiça revolucionária” contra o oficial americano que lutara na Guerra do Vietnã (1964/75).
O fulminante fuzilamento do “agente imperialista” tornou-se a principal manchete dos jornais e do noticiário das TV no mundo inteiro.
Anunciava bombasticamente que havia resistência armada contra o regime dos generais no Brasil.
O “panfleto subversivo” escrito pelo professor de português João Leonardo projetava a VPR no radar da guerra revolucionária na América Latina.
Mais tarde, os intelectuais esquerdistas, os “da pena”, foram afastados da organização pelos militaristas para desobstruir o caminho da revolução.
“A companheira do professor, Manoelina, foi inocentada pelo zeloso delegado Alcides, para quem ela apenas ‘enamorou-se perdidamente'” – escreveu Percival de Souza (pg 189, Autópsia do Medo – Vida e Morte do Delegado Sérgio Paranhos Fleury, Ed. Globo, 2000).
“Porquinho relatou que a vida da mulher ‘foi profundamente investigada e não se lhe encontrou nenhuma participação em qualquer ato subversivo ou terrorista. Era ela quem pagava as despesas da casa'”.
“A sua desdita foi amar esse homem despido de senso moral” – observou o delegado.
Percival continuou:
“Mas pode-se imaginar o que Manoelina passou, enquanto presa no Dops, porque o delegado consignou em sua apreciação”.
“Em decorrência de suas atividades (do professor) acarretou á sua companheira dias amargos e vexatórios”.
“Pediu ao juiz militar: ‘por dever de consciência solicito a exclusão da mesma da denúncia'”.
Como se lê, o Dr. Porquinho tinha consciência e deitava e rolava no papelório.
Como Deus na Terra, torturava os vivos e desfigurava e escondia os mortos.
Lobo, no dia seguinte á explosão do carro-bomba no QG do II Exército, no Ibirapuera, que estraçalhou por engano o soldado Kosel – os revolucionários queriam atingir a ala dos oficiais, não matar sentinelas, Lobo lamentou mais tarde – dirigindo normalmente seu táxi, como fazia todos os dias, foi levar um passageiro próximo ao local do atentado na entente da guerra.
Viu, então, o estrago que haviam causado durante a noite.
“O que está acontecendo?!” – perguntou, de forma inocente, para alguém, metido num congestionamento monstruoso nas ruas interditadas por barreiras, barricadas e soldados fortemente armados.
“Parece que explodiu uma bomba aí” – o outro respondeu referindo-se á tremenda explosão que fez tremer vários quarteirões.
O passageiro desceu do táxi do guerrilheiro Pedro Lobo, ele deu meia volta e voltou para seu ponto no centro da cidade.

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